Instituto Brasileiro de Museus

Museu Imperial

Apresentação

publicado: 15/10/2024 14h18, última modificação: 16/10/2024 11h55


A escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie alerta sobre “o perigo de uma história única”. Dentre os males advindos da perspectiva da historiografia tradicional, que privilegiou as “grandes personagens” a partir de um viés eurocêntrico, talvez, os principais sejam a incompletude e a impossibilidade de abertura para outras formas de agenciamento e de existência, que se traduzem no apagamento de potencialidades e dos múltiplos sujeitos e temporalidades que compõem o mundo social.  
 
No intuito de ser um espaço, no mínimo, aberto a outras narrativas, não apenas àquelas tradicionalmente abarcadas por este periódico — um dos mais longevos no campo museal brasileiro, cuja primeira edição remonta a 1940 —, o Anuário do Museu Imperial-nova, fase buscou dialogar com recortes espaço-temporais diferenciados, destacando problemáticas e temas relegados ao silenciamento.  
 
Sem deixar de tratar dos objetos de pesquisa convencionais que utilizam fontes pertencentes a fundos mais conhecidos, como o Arquivo da Casa Imperial do Brasil, composto pela documentação de caráter privado das famílias real de Portugal e imperial do Brasil, a edição 2023 traz a lume documentos relativos ao período republicano, em especial os produzidos nas décadas de 1930 e 1940, que compõem o acervo da instituição e são imprescindíveis para a história de Petrópolis e do país. O intento se efetiva, por exemplo, com a reunião de cinco artigos escritos a partir das comunicações proferidas no congresso “A Petrópolis do Museu Imperial”, ocorrido em setembro de 2023, durante a vigência da exposição homônima, comemorativa dos 180 anos da criação da Povoação Palácio de Petrópolis e dos 80 anos da inauguração do Museu Imperial. 
 
  Além disso, o quarto volume publica artigos e uma conferência redigidos por pesquisadores externos, consulentes que realizaram a sua pesquisa a partir do acervo sob a guarda do Museu Imperial, e com os quais sempre há trocas muito frutíferas, quando conhecimentos e experiências são compartilhados e se retroalimentam.  
 
Outra marca do periódico é a difusão da produção técnica da equipe do Museu Imperial. Se o selo Qualis-Capes, concedido no quadriênio 2017-2020, baseado apenas na edição de 2020, a primeira da nova etapa, chancela o caráter acadêmico dos textos veiculados, há que se ressaltar a outra face desta publicação, que também apresenta estudos, memoriais de exposições e de projetos, produzidos no âmbito das ações rotineiras de um museu e que, justamente por isso, possuem o aspecto técnico. 
 
É importante ainda sublinhar a interdisciplinaridade que os textos aqui reunidos reforçam, no diálogo possível entre as áreas que distinguem o universo museal — por exemplo, a Museologia, a Biblioteconomia, a Arquivologia, a História, o Patrimônio e a Educação — e outras como a Arquitetura, o Jornalismo, a Linguística, a Física e a Química.  
 
Deixo o convite para uma leitura que possa atestar essas proposições num encontro com a Coleção Geyer, o primeiro papel fabricado no Rio de Janeiro, os diários e as traduções de D. Pedro II, os diários do príncipe de Joinville, os projetos arquitetônicos de Theodor Marx e os retratos da imperatriz D. Leopoldina; para uma reflexão que possa abrir novos olhares sobre a história de Petrópolis e outros aspectos da ocupação de seu território, como as localidades do Itamarati e do Quitandinha; para que se conheça os fascismos, o rodoviarismo e os projetos urbanísticos e turísticos do período republicano; para que se note as edificações da cidade em sua riqueza arquitetônica, o legado Art Déco e as suas casas como documentos históricos; para que se considere temas tão prementes, como os (pós) abolicionismos, a acessibilidade cultural e a inclusão de pessoas com deficiência. Sobretudo, retomando a fala de Chimamanda Ngozi Adichie, para que se veja que “as histórias importam. Muitas histórias importam”.  
 

Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas