Instituto Brasileiro de Museus
Museu ImperialPalavra das Curadoras

Fale-me de Pedro: nas minúcias da memória
No “espaço biográfico” de D. Pedro de Alcântara, formado pelas escritas de si, pelas narrativas dos biógrafos, pelo conhecimento histórico produzido nos e pelos “lugares de memória”, como os erigidos na cidade de Petrópolis, houve a contação de uma história única, que apenas recentemente tem sido confrontada.
Esta exposição reconhece a trajetória de D. Pedro II como incontornável para a compreensão do mundo social no Brasil e como um microcosmo das transformações que marcaram a passagem para a modernidade, mas não se contenta somente em reproduzir retratos há muito tempo cristalizados. Assim, buscou contemplar os diversos momentos e as múltiplas formas de tratamento da figura de D. Pedro II: no período de sua vida, nas escritas autorreferenciais; no processo de reabilitação da sua memória, no contexto republicano; na abordagem nos arquivos, nos periódicos, nas biografias e nos textos acadêmicos.
As minúcias da memória são fundamentais para que a composição desses variados discursos seja esquadrinhada. São o fio para as reflexões sobre os diálogos que o presente estabelece com o passado e para a compreensão de como as disputas de narrativa em torno de D. Pedro II condicionaram a sua memória e a do período imperial.
A trajetória de D. Pedro II – contada a partir das minúcias da memória – revela complexidades e inflexões. Reitera que a vida não é uma linha reta, que há várias pessoas em uma, impulsionadas por desejos, ambições e, muitas vezes, obrigações. As memórias embasaram a leitura do que a cercou e foram, elas mesmas, influenciadas pelo espaço social e pelo tempo presente. Dessa contradição, permanece um legado, herança trabalhada na perpetuação (ou silenciamento) de uma imagem, a partir do que as pessoas pensaram – ou do que se pretendia que elas pensassem.
Quando falamos de D. Pedro de Alcântara, o que nos vem em mente? Certamente, poucos saberão a quem estamos nos referindo, se não o tratarmos pelo título que o tornou conhecido: D. Pedro II. No caso, o sujeito por trás do estadista, que governou por 48 anos, estaria esmaecido. Um homem com suas histórias de infância, paixões, hobbies, conflitos e sofrimentos. Tudo isso misturado ao governante, forçado a passar os últimos dias de sua vida distante da terra onde nasceu e amou.
Observar as batalhas pela memória, especificamente em Petrópolis, é um recorte. Se aqui D. Pedro II foi visto como uma personagem essencial e a imagem do cidadão, mais do que a do monarca, sobressaiu em meio à paisagem do centro da cidade – como se D. Pedro de Alcântara estivesse a observar as múltiplas apropriações que as gerações seguintes fariam em torno da sua figura –, atualmente, as ressignificações dessa memória apontam horizontes de expectativas mais inclusivos para o futuro.
Na exposição, que conta exclusivamente com itens do acervo do Museu Imperial, poderá ser vista uma diversidade de objetos e documentos, com destaque para aqueles que pertenceram a D. Pedro II, ou foram produzidos por ele, como a camisola que usou quando bebê, os livros em que deixou anotações e as cadernetas, nas quais registrou as suas viagens, incluindo a do exílio, pela primeira vez expostas para o grande público. Esses diários, como outros documentos relativos às viagens do imperador, que também compõem a mostra, são nominados no Programa Internacional Memória do Mundo da UNESCO, reconhecimento equivalente ao título de Patrimônio da Humanidade. São memórias que pertencem à coletividade.
No bicentenário de nascimento de D. Pedro de Alcântara, convidamos os visitantes a uma jornada pela sua trajetória, conduzida pelas minúcias da memória, na qual, no final das contas, restará a pergunta: que memória persiste, quando falamos de Pedro? “Fale-me de Pedro nas minúcias da memória”!
Alessandra Bettencourt Figueiredo Fraguas
Flávia Maria Franchini Ribeiro
Curadoras